“Por que ele curte fotos de outras mulheres?”
“Por que ela segue ex-namorados?”
“Se ele me ama, por que ainda responde stories de gente solteira?”
“Ela posta tudo, menos a gente.”
Essas são perguntas cada vez mais comuns nas sessões de casal e também no setting individual. Redes sociais, especialmente o Instagram, tornaram-se uma espécie de palco moderno onde o olhar do outro é capital afetivo — e o modo como se ocupa esse espaço virtual interfere diretamente na vida emocional de quem está fora da tela, mas dentro da relação.
É importante dizer: o Instagram, por si só, não é o problema. Ele funciona como um amplificador de questões já existentes: insegurança, ciúme, sensação de invisibilidade, dificuldade de confiar, desejo de controle, medo da perda. A rede social é o pano de fundo, não o enredo principal.
Na perspectiva psicanalítica, o que mais mobiliza não é o clique em si, mas o que ele representa na fantasia do parceiro. Quando alguém sofre com as curtidas do outro, geralmente está lidando com uma ferida narcísica mais profunda:
“Será que sou desejável?”
“Será que sou suficiente?”
“Por que ele precisa olhar para fora, se me tem aqui?”
A imagem curtida pode funcionar como um gatilho de exclusão inconsciente. O parceiro ou parceira se vê projetado em uma posição de “não objeto de desejo”, o que pode remeter a histórias mais antigas de rejeição, abandono ou rivalidade.
Do ponto de vista relacional, o Instagram coloca o desejo em exposição — e isso pode ser vivido como ameaça, especialmente quando a relação real está fragilizada. Curiosamente, as redes criam uma falsa sensação de intimidade com desconhecidos, ao mesmo tempo em que instauram distâncias dentro da relação concreta.
O convite clínico, nesse caso, é deslocar a pergunta do “o que ele faz no Instagram?” para:
- “O que isso me provoca?”
- “O que eu temo perder quando ele ou ela olha para fora?”
- “Que lugar ocupo — ou desejo ocupar — no desejo do outro?”
- “O que eu preciso para me sentir segura(o) nessa relação? E o que eu ofereço?”
Nem tudo que fere é traição. Mas tudo que fere merece escuta.
O Instagram pode funcionar como uma prateleira narcísica onde se mede valor por visualizações, validações e likes. Mas no amor verdadeiro, o desejo precisa ir além da vitrine. Ele precisa tocar o real do vínculo, o compromisso com o encontro e a construção mútua.
Algumas perguntas podem ser úteis para o casal refletir: em uma conversa:
- Vocês já conversaram sobre os limites que desejam ou não estabelecer nas redes?
- Há espaço para escutar a dor do outro sem acusação?
- A rede social está encobrindo alguma carência da relação real?
- O Instagram está substituindo ou sabotando o diálogo?
O Instagram não é a causa do conflito. Ele é o espelho onde, às vezes, se projetam feridas que ainda não cicatrizaram.
O trabalho terapêutico convida à implicação: reconhecer o que me cabe, o que me atravessa, e como desejo lidar com isso no campo da relação — e não apenas da imagem.